Assédio no trabalho: o que todo RH precisa saber

O ambiente de trabalho deveria ser um local seguro e produtivo para todos, concorda? Infelizmente, a realidade nem sempre é essa. O assédio no trabalho é uma questão séria e, para profissionais de RH, entender suas nuances e saber como combatê-lo é mais do que uma responsabilidade, deve ser um compromisso constante e inegociável.

Entre 2020 e 2023, a Justiça do Trabalho julgou mais de 419 mil processos envolvendo assédio moral e sexual, com crescimento significativo das ações relacionadas a assédio sexual, que aumentaram 44,8% no período, e 5% para o moral. Assuntos delicados, como um caso de assédio, podem trazer uma sensação de insegurança para agir, mas quanto mais você, profissional de RH, entender sobre a questão, mais sentirá confiança para agir nessas situações.

Você pode pensar: “mas a minha empresa é pequena e as pessoas se dão super bem”. E quando acontecer? O assédio deriva de outros problemas estruturais envolvendo questões de gênero, então onde há pessoas, há o risco dele acontecer mais cedo ou mais tarde. É extremamente importante saber reconhecer e nomear o problema para agir de uma forma efetiva.

Este artigo é o seu guia sobre assédio no trabalho. Vamos entender os detalhes que envolvem essa questão, abordando desde as diferentes formas de assédio até as melhores práticas para prevenção e gestão de casos. 

Queremos que você se sinta mais confiante para proteger seus colaboradores, promover uma cultura de respeito e garantir que sua empresa seja um exemplo de ambiente saudável. Afinal, um RH ativo, estratégico e bem informado faz toda a diferença, além de ser uma oportunidade do profissional ser valorizado pela sua maturidade e conhecimento.

O que é considerado assédio no trabalho?

Sabemos que falar sobre assédio no trabalho não é fácil, mas é fundamental. Uma das responsabilidades dos profissionais de RH é garantir que a cultura e o ambiente de trabalho sejam seguros, e para isso, é necessário entender o que configura assédio e como ele se manifesta. 

O assédio, em sua essência, se refere a situações em que um profissional é exposto a condutas constrangedoras, inconvenientes ou abusivas. Existem dois tipos principais que merecem sua atenção: o assédio moral e o assédio sexual.

Assédio moral vs. assédio sexual: entenda a diferença

Ambos têm o objetivo de humilhar, constranger ou ofender, e podem ser verbais ou físicos. Mas a forma como se caracterizam muda:

  • Assédio Moral: Aqui, a repetição é um fator principal para a definição. Um comportamento isolado, por mais que cause dano, não configura assédio moral. No entanto, se as situações são repetitivas, com o intuito de atormentar ou desqualificar o profissional, estamos falando de assédio moral.

  • Assédio Sexual: Basta uma única situação para configurar assédio sexual. Ele pode se manifestar de duas formas:

    • Chantagem: quando a aceitação ou recusa de uma proposta sexual afeta a situação profissional da pessoa (promoção, demissão, etc.).

    • Intimidação: comportamentos que tornam o ambiente de trabalho hostil e humilhante, como comentários ou exibições de material de cunho sexual.

O termo "assédio" é bastante amplo e é por esse motivo que resolver esses casos nas empresas pode ser desafiador. Além de conhecer as definições, quem lida com uma denúncia precisa ter muita sensibilidade para compreender a natureza do problema.

Algo importante para você ter em mente é que o assédio sexual geralmente vem acompanhado de situações de assédio moral. Por outro lado, o assédio moral pode acontecer sozinho. Por isso, ao investigar um caso de assédio sexual, esteja preparado para identificar também as condutas típicas do assédio moral.

Outro ponto importante é que nem todo assédio é gritante. Muitos casos de assédio moral, em particular, são bem sutis, o que dificulta a percepção. Como RH, sua imparcialidade e empatia são cruciais durante a investigação para captar esses sinais que não estão explícitos.

Para aumentar a sua percepção sobre essas formas sutis de assédio, veja alguns exemplos:

  • Pegar o crédito pelo trabalho de alguém.

  • Impedir o desenvolvimento profissional de um colega.

  • Críticas irracionais, exigências absurdas ou comentários degradantes.

  • Microgerenciamento excessivo.

  • Espalhar boatos ou difamar alguém.

  • Fazer piadas ou ridicularizar a aparência, etnia, orientação sexual de outras pessoas.

  • Exigir uma carga de trabalho impossível de ser cumprida.

  • Comportamentos passivos agressivos constantes.

  • Invadir a privacidade alheia com comentários desnecessários sobre a vida pessoal.

  • Minimizar os sentimentos e emoções de alguém.

E o assédio sexual também pode se manifestar de formas sutis, como:

  • Perguntas desconfortáveis sobre a vida sexual, identidade de gênero ou orientação sexual.

  • Comentários sobre a aparência de alguém ou o compartilhamento de conteúdos de cunho sexual sem permissão.


Veja algumas dessas situações aplicadas no dia a dia:

Situação 1: Um analista de dados passa semanas desenvolvendo um novo dashboard que otimiza relatórios. Na apresentação para a diretoria, o gerente da área apresenta o projeto como se fosse sua ideia original, minimizando o papel do analista e levando todos os elogios. Essa situação se repete em vários momentos e o analista, mesmo que se sinta incomodado, não sente segurança para falar com a sua liderança, nem com o RH.

Situação 2: Após um desentendimento, um colega começa a ignorar o outro em reuniões, responde a e-mails com frases curtas e secas, e faz comentários sarcásticos em público que, embora não sejam abertamente hostis, transmitem desprezo e irritação. Esse colega que ignora costuma ter o mesmo comportamento todas às vezes que ele tem um desentendimento com alguém. 


Quem sofre assédio tem sua saúde emocional e mental gradualmente deteriorada, podendo desenvolver estresse, depressão, ansiedade e outros problemas físicos. Consequentemente, a produtividade e a qualidade do trabalho dessa pessoa caem drasticamente. Por isso, que o assédio se enquadra como um fator de risco psicossocial, essas situações podem levar a pessoa colaboradora a desenvolver graves problemas de saúde.

É essencial que profissionais de RH e lideranças estejam atentos aos sinais, mesmo que nenhuma denúncia formal tenha sido feita. A intervenção precoce pode evitar danos maiores e garantir um ambiente de trabalho realmente respeitoso.

Saiba como se preparar para lidar com casos de assédio com o artigo: Casos de assédio vão acontecer. Como se preparar para lidar com eles? 

Como o assédio se mantém: a cultura do silêncio

Existem diversos motivos que levam as pessoas a não denunciarem situações de condutas inadequadas no ambiente de trabalho. Entre os principais estão o receio de exposição, o medo de retaliações e, principalmente, a sensação de que "nada vai acontecer". Esses fatores alimentam a chamada cultura do silêncio, um ambiente onde abusos são ignorados, relativizados ou escondidos.

A cultura do silêncio pode envolver desde o silenciamento ativo, quando há o medo ou repressão, e o silêncio passivo, que acontece por colaboradores não acreditarem que o cenário pode mudar. Vale lembrar que não ter denúncias formais não significa que comentários não possam ser feitos informalmente, pela rádio peão, por exemplo.

Diante disso, cabe ao RH o papel estratégico de quebrar essa cultura de silêncio. Isso começa com o fortalecimento de valores organizacionais como ética, transparência e segurança psicológica. Quando a organização demonstra, na prática, que está disposta a ouvir e agir, os colaboradores sentem-se mais seguros para falar.

Uma das estratégias mais efetivas para romper com a cultura do silêncio é disponibilizar canais seguros e confidenciais de escuta, como o canal de denúncias. Essa ferramenta viabiliza o relato de situações de assédio ou condutas abusivas sem exposição direta, tornando o enfrentamento do problema mais acessível e menos arriscado para a vítima, além de, claro, ter a documentação de todos os passos desde que uma denúncia chega.

Você pode pensar, será que um formulário ajudaria a resolver o problema? O grande problema desse recurso é que ele pode não oferecer tanta segurança de anonimato e reforçar a insegurança dos colaboradores, além de gerar uma carga de trabalho maior para o RH, uma vez que eles precisam gerenciar o funcionamento do formulário.

Além disso, um canal de denúncias oficial permite que a empresa tenha visibilidade sobre riscos reais, tome medidas internas de proteção e registre formalmente os relatos, o que é fundamental inclusive do ponto de vista jurídico. Esse histórico pode ser essencial para identificar padrões, apurar condutas e agir de forma justa e responsável.

É importante destacar que, quando a empresa se omite diante de denúncias, ela reforça a cultura do silêncio e se expõe a riscos legais. Se uma pessoa colaboradora aciona o canal ou diretamente ao RH e não vê nenhuma providência sendo tomada, a própria organização pode ser responsabilizada em ações junto ao Ministério Público do Trabalho.

Veja como acolher uma pessoa colaboradora que passou por uma situação de assédio em 5 dicas para lidar com uma pessoa que passou por uma situação de assédio sexual


 

Quais as consequências do assédio no ambiente de trabalho?

Quando falamos de assédio no ambiente de trabalho, estamos falando de algo que vai muito além de uma simples "situação desagradável", é uma violação séria que compromete a estrutura e o bem-estar de toda a empresa. 

Imagine um ambiente onde as pessoas não se sentem seguras para ser quem são ou para expressar suas ideias. Colaboradores que vivenciam ou testemunham situações de assédio tendem a apresentar uma queda significativa na saúde mental, no engajamento e, consequentemente, na produtividade. Pense bem: como alguém pode dar o seu melhor se está constantemente preocupado em ser humilhado ou constrangido?

Essa insegurança e o medo acabam se tornando um terreno fértil para a desconfiança, a desmotivação e o isolamento nas equipes. O clima organizacional, que deveria ser de colaboração e respeito, fica pesado, afetando diretamente o desempenho geral e a capacidade da empresa de inovar e crescer. É um círculo vicioso que prejudica a todos.

Além dos danos humanos e culturais, o assédio traz consigo riscos muito reais do ponto de vista jurídico e financeiro para a empresa. Quando uma situação de assédio não é devidamente apurada e tratada internamente, ou pior, quando há omissão, a organização pode ser acionada judicialmente. Estamos falando de processos trabalhistas baseados em alegações de assédio moral ou sexual, omissão institucional ou danos morais.

A vítima tem o direito de entrar com uma ação individual tanto contra o agressor quanto contra a própria organização, especialmente se houver indícios de que a empresa se omitiu diante da denúncia ou não adotou as medidas protetivas adequadas.

Um dos principais riscos é a rescisão indireta do contrato de trabalho. Isso significa que o colaborador pode "demitir" a empresa por justa causa, saindo com todos os seus direitos garantidos, alegando que houve uma quebra do vínculo de confiança ou que foi exposto a situações humilhantes. Além disso, a empresa pode ser condenada a pagar indenizações por danos morais, cujo valor varia conforme a gravidade do caso, o histórico da empresa e o impacto causado ao colaborador. 

Vale lembrar que o Ministério Público do Trabalho (MPT) pode intervir em casos mais complexos, especialmente quando há indícios de condutas sistemáticas, reincidência ou uma omissão estrutural por parte da empresa. Nesses cenários, a empresa pode ser alvo de ações civis públicas, termos de ajustamento de conduta (TAC) ou multas administrativas.

Por tudo isso, é importante que profissionais de RH saibam construir um processo estruturado de escuta e apuração. Não é apenas uma questão de conformidade, mas de proteger os colaboradores e a própria carreira, uma vez que pode recair sobre o RH a responsabilidade de não ter gerenciado devidamente uma situação que oferece riscos legais e reputacionais para a empresa.

Saiba mais sobre os custos e impactos da saúde mental para uma gestão estratégica de RH em Saúde Mental: Você não sabe, mas o custo para a empresa pode ser enorme


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Prevenção começa com cultura: o que o RH pode fazer

Após entender as diferentes características do assédio, a pergunta que fica é: como podemos evitar que isso aconteça?

A resposta vai muito além de regras e punições; ela reside na construção e manutenção de uma cultura organizacional segura e saudável. A prevenção não é somente uma tarefa, mas um pilar estratégico que exige proatividade, sensibilidade e um olhar atento para o DNA da empresa. 

É um compromisso contínuo com o bem-estar de cada colaborador, impactando diretamente a produtividade, o clima e a própria reputação da organização. Por isso, entender e implementar ações preventivas é uma necessidade para construir uma cultura verdadeiramente segura e saudável.

Conscientize os colaboradores

O primeiro passo, e talvez o mais importante, é garantir que todos na empresa estejam cientes sobre o tema do assédio. Para isso, é crucial ter um código de conduta claro e acessível, que detalhe as atitudes e valores esperados de cada um no dia a dia.

Além disso, por meio de canais de comunicação internos, treinamentos e dinâmicas com toda a equipe, é essencial ser transparente sobre quais comportamentos podem ser considerados assédio e os impactos profundos que eles têm na vida profissional e pessoal da vítima. É recomendado preparar um roteiro que aborde:

  • O que é assédio;

  • Como identificá-lo;

  • As punições previstas;

  • Como as vítimas podem agir nessas situações;

  • Medidas que garantam denúncias sem retaliações para a vítima.

Para saber mais sobre a criação de um código de conduta eficaz, confira nosso artigo: Como criar um Código de Conduta e Ética para a sua empresa?

Mapeie todos os aspectos da cultura organizacional

Se os casos de assédio não estão diminuindo, pode ser um sinal de que existem traços comportamentais tóxicos culturalmente enraizados na empresa. Isso pode se manifestar de diversas maneiras, como a falta de uma liderança inclusiva, normas de trabalho que incentivam a competitividade excessiva, uma hierarquia muito rígida ou uma comunicação baseada em estereótipos, entre outros fatores.

Nesses casos, o RH precisa identificar se as normas e valores estão sendo realmente colocados em prática no cotidiano e analisar os principais fatores de risco.

Veja mais sobre fatores de risco psicossociais no nosso artigo: Evite casos de assédio ao mapear fatores psicossociais 

Tenha alinhamentos constantes com as lideranças

A estrutura hierárquica pode, infelizmente, levar algumas lideranças a acreditar que têm "poder" sobre os colaboradores, o que pode resultar em situações constrangedoras ou estressantes.

Como muitas denúncias de má conduta são direcionadas a cargos mais elevados, é preciso realizar um trabalho especial de conscientização com aqueles que ocupam posições de liderança. 

Quando uma liderança demonstra um compromisso claro com a ética e a transparência, se torna um exemplo e promove uma cultura saudável na equipe e na organização. Isso faz com que as pessoas colaboradoras acreditem mais nos processos da empresa e que de fato as denúncias relatadas serão investigadas e tratadas de forma justa.

Tenha um canal de denúncias

O canal de denúncias é uma ferramenta poderosa se usada estrategicamente. Ele ajuda as empresas a terem visibilidade sobre problemas de conduta, permitindo que descubram casos de assédio com mais agilidade e realizem ações concretas para combatê-los e preveni-los.

Apesar de formulários e até mesmo e-mails parecerem uma forma simples de receber denúncias e dar voz aos colaboradores, esses recursos não podem garantir a confidencialidade, além de exigir um gerenciamento manual sujeito a falhas e acúmulo de demandas. Já um canal de denúncias estruturado, por outro lado, oferece mais proteção, organização e rastreabilidade.

Se você entende que, como profissional de RH, precisa agir mais ativamente na prevenção de casos de assédio, você pode começar por esses pontos:

  • Faça um diagnóstico do cenário e invista em pesquisas de clima, escuta ativa, canais de feedback.

  • Faça um mapeamento dos fatores de risco psicossociais por área/departamento.

  • Mantenha o código de conduta e políticas internas atualizados. Caso você não tenha esses documentos, talvez a hora de criá-los seja agora. Você pode conferir alguns modelos aqui.


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O assédio no trabalho é uma realidade preocupante que afeta a saúde dos colaboradores, o engajamento e a própria reputação da empresa. Os números mostram que o problema é sério e crescente, exigindo nossa atenção total.

Você, profissional de RH, é a peça-chave para mudar esse cenário. Sua atuação vai além da reação: é sobre construir uma cultura de respeito, onde o assédio não encontra espaço. Isso se faz com conscientização, um olhar atento aos sinais sutis, alinhamento com as lideranças e a garantia de canais de denúncia seguros.

Lembre-se: a ausência de denúncias não significa ausência de problemas. Quebrar a cultura do silêncio é indispensável nesse processo.


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Assédio moral: 3 sinais de alerta no ambiente de trabalho.

6 características de ambientes de trabalho tóxicos.

Podcast: canal de denúncia como prevenção ao assédio.


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