A gestão de má conduta no trabalho deve fazer parte da estratégia de ESG?
O papel do profissional de Compliance muda de foco, de acordo com as demandas do mercado e da sociedade. A pandemia de COVID-19, no entanto, serviu como fator acelerador para que as empresas assumissem uma postura mais atenta em relação aos programas de ESG.
Todo o cenário de incerteza fez com que as agendas de pautas atreladas a ESG nas organizações fossem colocadas como exigência urgente no mundo corporativo. Esse movimento influencia diretamente a conduta da área de Compliance.
De um lado, instituições financeiras e órgãos reguladores cobram um posicionamento estruturado e claro quanto a ESG e Compliance, em especial seus planos de ações para mitigar riscos.
Do outro, vemos pessoas consumidoras e candidatas cada vez mais informadas e conscientes - o que impulsiona o interesse dos investidores ao ponto chave: ir além do obrigatório quando o assunto é ética profissional. As empresas precisam se colocar no mercado como responsáveis, vigilantes, coerentes e conscientes em relação a aspectos ESG.
O que é ESG e como isso se aplica às empresas
Do inglês, ESG é a sigla para “environmental, social and governance” - traduzindo para ambiental, social e governança. Cada letra representa uma questão atrelada à operação da empresa, que deve ser mensurada como forma de minimizar impactos e tornar o negócio mais sustentável nessas três frentes.
O compromisso das empresas com cada uma dessas frentes requer adaptações e estratégias assertivas em suas atuações, uma vez que precisam monitorar práticas e reportar avanços aos stakeholders.
A ideia de que o profissional de Compliance só direciona esforços para mitigar riscos estratégicos ao meio ambiente ficou para trás há muito tempo. Organizações em todos os países deixaram de tratar a sustentabilidade apenas como um projeto ambiental ou social paralelo e, hoje, entendem a importância de conectá-la à estratégia do negócio.
Marília Zulini e Onara Oliveira, Superintendentes de Compliance e ESG no Grupo CCR, fizeram algumas análises de como esse movimento se dá na prática:
“Deve existir um processo de aculturamento, dada a transversalidade do ESG. Todo o aprendizado obtido na estruturação do Programa de Compliance pode ser aproveitado pela área de ESG: captar o apoio da alta e média liderança, disseminando a cultura da ética e da integridade com comunicação, treinamento, elaboração de políticas e procedimentos.
Fazendo analogia com os nossos negócios, é como se as áreas de Risco e Compliance tivessem pavimentado um caminho para o ESG, que agora constrói pontes conectando as áreas social e de meio ambiente - antes dispersas - com a governança corporativa.
Desde o início do ano, vamos juntas em visitas às unidades, aplicamos treinamentos, apresentamos as áreas e colhemos informações para a atualização da nossa matriz de riscos.
O processo de due diligence de terceiros, já estruturado e consolidado há mais de três anos no Programa de Compliance do Grupo CCR, foi ampliado para incluir pesquisas de histórico reputacional e temas relevantes para o ESG”.
Estratégias de ESG e Compliance: entenda a relação
O aumento na cobrança por estratégias de ESG no mercado ajuda a disseminar o programa de Compliance dentro das empresas. Isso acontece porque o profissional de Ética tem um papel essencial na garantia de práticas efetivas atreladas a ESG.
Pense bem: até então, a área buscava combater problemas de má conduta com argumentos jurídicos, como forma de “seguir um modelo correto de atuação” e garantir a conformidade legal.
Com ESG e Compliance na mesma equação, existem mais argumentos - em especial, aqueles que afetam o bolso de acionistas - para delimitar o certo e o errado dentro do ambiente de trabalho em termos de comportamento.
ESG e Compliance são agendas que devem caminhar juntas. Uma gestão de riscos efetiva precisa considerar aspectos ambientais, sociais e de governança. Lideranças precisam ter em mente que cada uma das letras que compõem a sigla impacta no desempenho econômico-financeiro das organizações.
O papel de um canal de denúncia e escuta na estratégia de ESG
Um ponto desafiador para efetivar programas de ESG é a mensuração das estratégias. Tangibilizar resultados nos aspectos sociais e de governança requer ferramentas específicas, que facilitem a coleta e análise de dados internos.
É aí que entra a importância de um canal de denúncia e escuta eficiente. É fundamental que a estratégia ESG de uma empresa inclua uma solução de comunicação segura e transparente, com recurso de anonimato. Dessa forma, equipes podem relatar má conduta e outras questões no ambiente de trabalho, sem se preocupar com o medo de retaliação, por exemplo.
Só é possível estruturar de forma concreta a gestão de riscos internos, em especial aqueles atrelados à ética profissional, quando uma plataforma atende às demandas do Compliance e das pessoas colaboradoras.
Existe uma clara demanda para empresas irem além da obrigatoriedade de implementar um canal de denúncia. Formatos tradicionais da ferramenta não garantem que relatos serão feitos e, principalmente, que serão apurados e resolvidos com assertividade, de forma rápida.
De acordo com a BenefitsPRO, a média para a resolução de denúncias em canais tradicionais é de cerca de 25-30 dias. Vale pensarmos pelo seguinte caminho: este longo período é pouco funcional, uma vez que abre brechas para que a empresa encare riscos maiores com processos e danos à reputação.
Nessa lógica, nenhum investidor quer assumir os riscos de um relato sem resolução por tanto tempo, certo? Por isso, a escolha do canal de denúncia e escuta é crucial para fortalecer a imagem da ética profissional e da seriedade das lideranças em relação a má conduta.
Dar ao Compliance as ferramentas necessárias para gerir casos de má conduta com eficiência, e às equipes um canal de denúncia que transmite confiança, garante que uma cultura organizacional tóxica não se consolide.
Ética profissional como fator determinante para as empresas
É fácil concluir porque uma empresa que direciona esforços reais para aspectos ESG apresenta melhoras em seus resultados. A escolha do canal de denúncia e escuta é um passo crucial para trazer clareza aos planos de ação, e deve ser olhado com atenção.
Lideranças que não investem em soluções para tornar práticas de ESG e Compliance mensuráveis estão mais expostas a riscos e, como consequência, perdem valor diante de stakeholders.
Permitir que problemas de comportamento se tornem estruturais no ambiente de trabalho impacta diretamente na percepção pública do negócio. Cada vez mais, medidas proativas na gestão de má conduta escancaram quem se limita à campanhas de marketing e RP superficiais.