6 mitos sobre assédio no trabalho
É cada vez mais comum ouvirmos sobre assédio em diferentes âmbitos da vida em sociedade e, não por acaso, o ambiente de trabalho ganha destaque nesse sentido.
Para que a gestão estratégica de pessoas entenda o problema de forma estrutural, é preciso analisar o assédio como uma manifestação de abuso de poder. As relações hierárquicas que existem na sociedade e dentro das empresas abrem caminho para que esse tipo de conduta aconteça.
Apesar do tema estar em foco no mundo corporativo, que já reconhece a importância da saúde mental no trabalho, muitos mitos ainda impedem que esforços assertivos de combate ao assédio no trabalho sejam colocados em prática. É hora de desconstruirmos alguns deles.
Mito 1: A palavra “assédio” sempre está relacionada ao âmbito sexual
Apesar do problema do assédio sexual ganhar bastante atenção, o assédio moral também é uma prática comum no ambiente de trabalho. O que caracteriza o comportamento é a repetição de ataques e cobranças excessivas a uma pessoa. Por meio de ofensas que constrangem e humilham, a pessoa tem sua dignidade e personalidade fragilizada, menosprezada.
Alguns exemplos de práticas que configuram assédio moral são:
Fazer comentários degradantes e insultar uma pessoa ou seu trabalho;
Tomar crédito pela conquista da pessoa;
Dar instruções confusas e imprecisas propositalmente;
Espalhar boatos e fofocas entre equipes com constância;
Micro gerenciar atividades de forma insistente quando não há necessidade, impondo prazos irracionais;
Promover o isolamento, recusar ou dificultar a comunicação com a pessoa.
Mito 2: O assédio sexual no trabalho só acontece com mulheres
O Código Penal define assédio sexual como “constranger alguém, com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”.
Por se tratar de um problema de comportamento que tem como raiz as relações de poder, é comum que o assédio sexual aconteça com mulheres e seja praticado por homens. No entanto, a compreensão de abusos de poder deve considerar as desigualdades decorrentes de estruturas sociais. Isso inclui classe, etnia, orientação sexual, idade, gênero...
Nessa lógica, uma mulher pode assediar sexualmente um homem que ocupe cargos inferiores a ela na hierarquia da organização, por exemplo.
Para que o combate ao assédio no trabalho se dê de forma efetiva, é importante que a gestão estratégica de pessoas tenha clareza dos diferentes tipos de relação de poder que existem na sociedade.
Mito 3: O assédio moral sempre tem testemunhas
Nem sempre o assédio moral no ambiente de trabalho é facilmente detectado, especialmente para quem não está em situação vulnerável. Algumas práticas degradantes podem se dar de forma sutil, sorrateira.
Por se tratar de uma conduta que acontece durante um período prolongado, e não um comportamento pontual, o combate ao assédio no trabalho requer uma análise atenta do conjunto de pequenos atos insistentes.
Em um primeiro momento, esses atos podem não ser percebidos como intencionais. Por outro lado, em repetição, caracterizam a deterioração do trabalho da vítima, o isolamento e o ataque a sua dignidade.
Mito 4: “Se aconteceu tantas vezes, por que o comportamento só foi relatado agora?”
Relatar situações de assédio é uma tarefa difícil, ainda mais com o envolvimento de temas sensíveis como o abuso de poder. Quando a pessoa sente que sua carreira está em jogo, o cenário é ainda pior.
Em uma pesquisa realizada pelo Vagas.com com mais de 5 mil pessoas, 47,3% já sofreu com o assédio moral. Deste grupo, a maior parte (39,4%) não fez nenhum relato sobre os acontecimentos por medo de perder o emprego.
Já com situações de assédio sexual, números levantados pela Think Eva com 381 pessoas apontam que 47,12% já sofreu situações de assédio sexual no ambiente de trabalho. Desse grupo, 78,4% vê a impunidade como a principal barreira para que sejam abertos relatos.
Isso significa que o silêncio das equipes é consequência de uma cultura organizacional problemática, que não transmite segurança. Dificilmente, a falta de relatos vai indicar a ausência de problemas de comportamento.
Existem inúmeros obstáculos ao longo do processo de relatar de má conduta, que precisam ser levados em consideração pela área de gestão estratégica de pessoas. Nesse caso, o primeiro passo é reconhecer que o assédio existe dentro da empresa para então preveni-lo.
Mito 5: Com o trabalho remoto, os casos de assédio sexual nas empresas diminuíram bastante
O modelo de trabalho remoto traz a ilusão de que alguns problemas do convívio diário em escritório são resolvidos pela distância. No entanto, as relações de poder que permeiam o ambiente de trabalho não dependem de um espaço físico para existirem - consequentemente, casos de má conduta também não.
O cenário online conta, ainda, com alguns fatores agravantes: a ausência de testemunhas ou autoridades, e a sensação de impunidade. Quando muitas pessoas passaram a cumprir suas funções virtualmente, trouxeram para dentro de suas casas as situações de assédio sexual também.
Em uma pesquisa realizada pela AllVoices com 822 pessoas, 38% sofreu assédio sexual por meiode e-mail, chat, videoconferência ou ligaçãode telefone. Ainda nesse grupo, 24% acreditam que o problema de comportamento piorou neste cenário à distância. Os números confirmam: as empresas devem continuar colocando em foco a saúde mental no trabalho, mesmo no modelo remoto.
Mito 6: O assédio no trabalho não afeta a empresa
Os esforços de combate ao assédio partem da ideia de que o comportamento deve ser repreendido moralmente. No entanto, alguns números justificam o foco das empresas na importância da saúde mental no trabalho.
Existe uma relação evidente entre ambiente tóxico de trabalho e o risco de doenças físicas e psicológicas das equipes. Um exemplo comum é o burnout, que muitas vezes é desenvolvido como reflexo de casos de assédio moral.
Sintomas como falta de concentração e atenção crônica, baixa autoestima e irritabilidade são comuns em pessoas que apresentam a condição. Como consequência direta, a produtividade das pessoas colaboradoras tem queda drástica.
Um clima tóxico cria uma necessidade constante de “fuga” como forma de se proteger. O reflexo é um crescimento das taxas de absenteísmo e turnover - que gera custos relevantes para a área de gestão estratégica de pessoas.
Isso sem mencionarmos os prejuízos financeiros e danos à reputação das empresas que fecham os olhos para casos de assédio sexual. Não é preciso ir longe nas pesquisas para encontrar notícias e posts sobre denúncias de assédio dentro de empresas.
Em um mercado cada vez mais atento e vigilante, permitir que problemas de comportamento façam parte da cultura organizacional significa comprometer o sucesso do negócio como um todo.
O combate ao assédio no trabalho deve ser de interesse das empresas
O cenário atual propõe mudanças relevantes na experiência das equipes, que buscam ser respeitadas e acolhidas em um ambiente que abre espaço para o diálogo seguro. Estes são valores inegociáveis para empresas que querem estar em destaque daqui para frente.
O assédio moral e sexual precisa fazer parte das discussões da sua organização. Falar sobre má conduta com as equipes mostra uma postura vigilante - que prioriza e defende a importância da saúde mental no trabalho.
Um combate efetivo ao problema requer que as lideranças reconheçam: problemas de comportamento existem em todos os ambientes de trabalho. Estar à frente, educar-se e buscar as ferramentas necessárias para enfrentá-los protege a empresa e as pessoas colaboradoras.