Os desafios da Gestão Jurídica e do Compliance no setor varejista com Fernanda Suganelli

O gosto pela área jurídica e pelo setor varejista nortearam a carreira de Fernanda Suganelli, que hoje é gerente jurídico dos Supermercados Mambo. Conversamos com ela para entender como o setor varejista se relaciona com questões de conformidade e ética na atualidade.

Como Fernanda afirma, não são apenas as empresas que estão preocupadas com questões de ética e de sustentabilidade social e ambiental, mas os clientes demonstram preferências por empresas que se preocupam com esses pontos. “É uma tendência”, afirma.

Confira o nosso papo:

Fernanda, conta pra gente um pouco da sua trajetória enquanto profissional na área jurídica e como é seu contato com áreas de conformidade e Compliance?

Minha trajetória se iniciou no setor industrial, no qual permaneci por sete anos. Em 2006, entrei para o setor varejista, trabalhei por quase 10 anos no Grupo Pão de Açúcar (GPA). Inicialmente  me dediquei à área de contratos e, depois, passei quatro anos atuando junto ao braço de e-commerce do grupo.

Eu era a responsável por todos os assuntos relacionados ao jurídico, incluindo contratos, contencioso cível, trabalhista, consumidor, entre outros.  Quando estava nessa função, tive meu primeiro contato com a área de Compliance. O GPA estava estruturando a área de Governança Corporativa, incluindo assuntos compliance e gestão de terceiros. As políticas corporativas da Controladora eram aplicáveis a todas as unidades de negócio.  Assim todas as unidades de negócio realizaram a implementação das novas diretrizes através de divulgação das políticas e realização de treinamentos. De forma muito didática. 

Após a minha saída do GPA trabalhei na Caedu, uma empresa varejista no ramo de vestuário. A Caedu contava com uma área de auditoria, gestão de riscos e de fornecedores o setor jurídico prestava apoio no tocante a revisão de políticas, procedimentos e adoção de medidas relacionadas ao canal de denúncia, entre outras.

As empresas já entenderam que adoção de medidas preventivas de Compliance e as ações relacionadas a ESG (Ambiental, Social e Governança) além de contribuir para um mundo mais sustentável, isso agrega valor a sua marca e sua imagem.

Depois dessas e outras experiências, cheguei ao Supermercados Mambo em novembro de 2021. Os procedimentos regulatórios de conformidade na área de varejo alimentar são bem específicos e rígidos. E os órgãos reguladores são atuantes e realizam fiscalizações com uma certa frequência.  

Atuando como gerente do jurídico de uma rede de supermercados, como você percebe os desafios relacionados à má conduta e à conformidade na área de varejo?

O maior desafio para o departamento jurídico de uma rede de supermercados é estar atento as constantes mudanças nos procedimentos e normas reguladoras do setor e garantir, juntamente com as demais áreas da empresa, o cumprimento e adequação da operação.

O dia a dia do varejo é muito intenso, assim um dos papéis fundamentais do jurídico é realizar um trabalho preventivo. Independente da realização de fiscalização pelos órgãos reguladores, a empresa monitora regularmente a sua operação, com foco na manutenção do atendimento aos procedimentos legais, bem como realiza treinamentos de reciclagem para seus colaboradores.

Temos que estar atentos, acompanhar o dia a dia, monitorar as atividades, ver como as coisas acontecem na prática e fazer esse trabalho preventivo, de conscientização. Essa atividade é realizada de forma conjunta com as diversas áreas da empresa.

Atualmente estamos reestruturando nossos meios de comunicação e implementando um canal específico para que nossos colaboradores e parceiros possam se manifestar sobre qualquer tipo de assunto. Nesse sentido é fundamental a realização de palestras de conscientização, trazer exemplos práticos para melhor compreensão sobre o assunto. A empresa precisa ter muito claro os seus processos e procedimentos que devem ser seguidos por seus colaboradores.


 

A mudança de mentalidade que provoca empresas a se adequarem a novos modelos de sustentabilidade ecológica e social endossa o papel educativo, sobretudo quando existe uma necessidade de prevenção. Como isso é feito no dia a dia?

Acredito que para uma empresa ter sucesso na implementação de uma política é fundamental a realização de treinamentos, palestras, principalmente entender o motivo da existência desse procedimento.

Quando você tem a preocupação, o cuidado com a pessoa colaboradora, ela se sente acolhida e como parte da empresa, e desta forma passa a adotar os novos modelos e procedimentos da empresa de forma natural e com engajamento e não simplesmente como um cumprimento de uma determinação.

Além das pessoas colaboradoras, o ecossistema de conformidade envolve os fornecedores. Uma das principais ferramentas para garantir que estejam todos na mesma página são os contratos.

Como você lida com a gestão contratual levando em consideração o objetivo de estabelecer relações éticas e de integridade com parceiros comerciais

O contrato de uma forma geral é uma ferramenta de extrema relevância para resguardar a empresa nas contratações. Estabelecer as condições comerciais, o que é esperado daquele contrato, deixar de forma clara todos os direitos e obrigações das partes. Prever cláusulas de confidencialidade, de compliance, de cumprimento das obrigações legais trabalhistas, tributárias e outras mais. Além de ter o contrato assinado é fundamental que seja feita a gestão desta contratação, se de fato tudo que foi acordado vem sendo cumprido.

Outro ponto importante é com relação à análise da documentação legal da empresa. Eu particularmente gosto muito da área contratual, pois aborda vários temas. O profissional da área contratual precisa conhecer o negócio de forma a tentar prevenir futuras discussões jurídicas. Geralmente as discussões jurídicas surgem de questões comerciais que não foram previstas de forma clara.

Faz parte da gestão contratual o monitoramento da qualidade dos produtos que estão sendo vendidos para garantir que nossos clientes tenham um excelente experiência de compra em nossas lojas. Garantir qualidade dos seus serviços, produtos e o atendimento ao cliente é que agrega valor a marca e a imagem de uma empresa.

Com base na sua trajetória, como você percebe a evolução das práticas de conformidade, sobretudo com a evidência que a pauta de ESG ganhou nos últimos anos?

A palavra “compliance” era vista anteriormente como algo burocrático e voltado especificamente a prevenção à corrupção, com o viés puramente legalista, mas na atualidade é algo que deve fazer parte dos valores da empresa.

Relativamente as práticas de ESG, entendo que de uma forma não estruturada muitas empresas já tinham isso como prática, como por exemplo: aquisição de energia de fontes renováveis, reciclagem, adoção de políticas de conflito de interesse, medidas de voltadas para saúde, segurança e bem estar dos seus colaboradores.

Como esse tema ganhou extrema relevância e notoriedade, as empresas estão revendo suas práticas e criando departamentos específicos, dedicados a este tema.

Dito tudo isso, como você enxerga a importância dos valores no ambiente corporativo e o que você considera essencial para nortear uma área de conformidade e integridade?

Os valores de uma empresa são pilares para garantir a perenidade e sustentabilidade. Eles devem se refletir nas ações do dia a dia dos seus líderes e colaboradores, de forma ética, transparente e gerando um clima de confiança e respeito.

Quando os valores da empresa estão enraizados em seus colaboradores e líderes isso reflete de forma positiva em suas ações e no resultado da empresa.



 
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