Psicologia comportamental: a ciência por trás de uma cultura de ética
Um dos grandes desafios da gestão de compliance é tornar as diretrizes do código de ética e cultura da organização parte do comportamento da equipe. Afinal, não existe cultura de conformidade sem o envolvimento das pessoas colaboradoras.
A estratégia para alcançar esse objetivo, que o compliance deve aproveitar e utilizar, é a psicologia comportamental.
Ao incentivar a ética e a conduta íntegra no ambiente de trabalho, cria-se uma relação direta com os comportamentos e vieses das pessoas do time.
Afinal, dizer que algo está certo ou errado, que deve ou não ser feito, e apontar a regra no Código de Conduta, não é o suficiente para garantir que um ambiente coletivo se modifique a partir das premissas estabelecidas em um documento.
Por isso, usar a ciência nas abordagens de comunicação sobre conduta no ambiente de trabalho é um divisor de águas para a criação de um compliance comportamental.
Neste artigo, explicamos o que é e os principais conceitos da psicologia comportamental e como esse conhecimento pode contribuir para o trabalho da gestão de compliance nas empresas.
O que é psicologia comportamental?
A teoria comportamental (behaviorismo) é uma das áreas da psicologia que estuda o comportamento humano. Essa vertente considera que atitudes são construídas a partir dos condicionamentos e experiências do ambiente em que a pessoa vive. Ou seja, o meio e os estímulos recebidos podem influenciar o comportamento de pessoas.
Ela também afirma que, a partir do entendimento do contexto e das influências que ele gera, a comunicação com uma determinada comunidade pode ser adaptada para realizar as mudanças desejadas.
Essa dinâmica relacional também existe no ambiente empresarial. O time precisa entender as regras de compliance como um valor pessoal – e não só uma lista de regras – para evitar comportamentos de risco e relatos de desvios.
Neste contexto, é válido ressaltar que a psicologia comportamental é uma área mais objetiva e mensurável que se baseia em evidências para chegar às conclusões. Por isso, uma abordagem de comunicação baseada em suas premissas ajuda a criar e fortalecer comportamentos no ambiente corporativo.
Leia também >>> 4 tipos de Cultura Organizacional: prós e contras.
Os principais conceitos da teoria comportamental
A psicologia comportamental é estudada de formas variadas por diversos pesquisadores e pesquisadoras para demonstrar como as influências afetam o comportamento humano.
Eles partem de um ponto comum: comportamentos são assimilados por meio de condicionamento, que é resultado dos mecanismos de estímulo e resposta.
Ou seja, quando uma pessoa associa que um comportamento gera uma determinada consequência, ela o mantém ou evita, se o efeito é positivo ou negativo. Por exemplo: seguir todas as orientações, alcançar o objetivo de um projeto e receber um bônus pelo resultado.
Os dois nomes que se destacam na área são os dos pesquisadores e psicólogos John B. Watson e Burrhus Frederic Skinner, ambos discípulos de outro nome importante dos estudos sobre condicionamento clássico, Ivan Petrovich Pavlov.
Behaviorismo metodológico
O Behaviorismo metodológico ou clássico é resultado das pesquisas de John B. Watson que se basearam em análises observativas e experimentativas.
Na abordagem do condicionamento clássico, defende-se que o comportamento pode ser previsto e controlado por meio de estímulos.
Um dos experimentos realizados por Watson, nomeado de ‘Pequeno Albert’, expôs um bebê calmo de nove meses ao contato com diversos elementos como ratinho branco, coelho peludo, cachorro, pedaço de algodão macio, entre outros, sem assustar a criança.
Enquanto o bebê interagia com os diferentes elementos, Watson introduziu um barulho alto de martelo batendo que assustava e fazia Albert chorar.
Com a repetição do padrão durante um ano, a criança passou a sentir medo dos elementos de interação antes mesmo de ouvir o som ou sem a sua presença.
Com isso, Albert passou de bebê calmo para ansioso e angustiado porque aprendeu a associar medo e choro aos elementos com os quais interagia, mesmo que antes eles não lhe causassem reações negativas.
Observação: o experimento de Watson tem problemas éticos sérios e não seria repetido nos dias atuais. O fato de um bebê ser o principal alvo dos métodos empregados, desconsiderou todas as consequências negativas que o contexto criaria na vida da criança permanentemente.
Behaviorismo radical
O behaviorismo radical surgiu dos trabalhos de Burrhus Frederic Skinner que defendia o conceito de condicionamento operante.
Segundo Skinner, a aprendizagem acontece por meio de reforços (positivos ou negativos) e punições. Diferentes comportamentos são fortalecidos ou não pelas consequências que eles geram. Sendo assim, o interesse de um indivíduo pela própria sobrevivência, autorrealização ou proteção, leva a um comportamento de repetição que o faz alcançar seu objetivo. Daí vem o termo condicionamento operante.
Com o behaviorismo radical, Skinner propôs que se o objetivo é consolidar um comportamento, ele deve ser incentivado por uma recompensa. Caso a atitude seja contrária, recebe-se uma punição.
No behaviorismo metodológico, o indivíduo não controla a associação estímulo-comportamento. Já no behaviorismo tradicional, o indivíduo é capaz de aprender a associar seu comportamento com as consequências.
É neste ponto que unimos a abordagem da psicologia comportamental à consolidação da cultura de compliance nas empresas.
Como a psicologia comportamental auxilia o compliance?
Um programa de compliance não deve se basear apenas na criação de regras. Elas por si só não garantem que as pessoas colaboradoras irão segui-las. Principalmente, porque a prática envolve os vieses pessoais de ética e comportamento de cada um.
Utilizando a psicologia comportamental nesse contexto, chegamos ao compliance comportamental. A abordagem coloca no centro as pessoas colaboradoras, seus desejos e a necessidade de se verem e serem vistas como indivíduos éticos e honestos.
O principal ponto que a gestão de compliance deve trabalhar é inspirar o time a agir em conformidade porque ele é capaz de fazê-lo, deseja zelar pela sua credibilidade – e da empresa – e quer contribuir positivamente com o todo.
Algumas ações dessa abordagem são:
Reforço positivo e reforço negativo
Na teoria de Skinner, o reforço positivo ou negativo é utilizado com o objetivo de criar novos comportamentos. No positivo, algo bom é adicionado e no negativo algo é removido do contexto.
Por exemplo: reconhecer os projetos que cumpriram todas as regras internas e externas para entrega de um resultado de excelência com um bônus ou um elogio geral, é um reforço positivo da importância dos requisitos de conformidade na prática.
Como todo profissional zela pela sua reputação e deseja crescer, seguir as diretrizes de compliance vai ao encontro desses interesses. Assim, comprova-se sua ética e ele se coloca no radar de oportunidades de crescimento na empresa.
Skinner também propôs a inclusão da punição como forma de parar um comportamento. O afastamento temporário por má conduta é um exemplo de medida de responsabilização para evitar conflitos durante as apurações.
A abordagem behaviorista foca no estímulo dos vieses de interesse próprio. Dessa forma, mostrar as consequências de ter um comportamento alinhado ao compliance aumenta as chances de a equipe praticá-lo.
Estímulo da comunicação entre a equipe
O fenômeno conhecido como ‘Efeito espectador’explica que se uma pessoa toma alguma atitude, executa uma ação, etc., todas envolvidas no mesmo contexto vão copiá-la. Dentro do ambiente corporativo, as lideranças têm esse efeito nas pessoas colaboradoras.
Se as equipes percebem no comportamento das posições de liderança o compromisso com a conformidade às regras da empresa, a tendência é que elas também as sigam.
Esse estímulo é reforçado a partir da boa comunicação das pessoas gestoras com seu time. O contato próximo evidencia valores, aspirações e incentiva a equipe a construir um posicionamento profissional ético.
Esclarecimento da finalidade do compliance
Como Skinner explica, o comportamento é uma consequência dos atos e receber os estímulos certos ajuda a direcioná-los e evitar as punições.
Por isso, quando a cultura da empresa reforça que o compliance “aprisiona” o comportamento e tira a liberdade das pessoas colaboradoras, o programa fracassa.
A abordagem deve esclarecer e reforçar que as condutas do Código de Ética da organização são diretrizes para o comportamento que as pessoas já são capazes de seguir.
Ou seja, o compliance reforça positivamente a autonomia das pessoas colaboradoras de aplicar seus valores na prática. Por isso, cria um ambiente livre de preconceitos, problemas de convivência e práticas ilícitas.
Para construir um ambiente de conformidade, contar com um software que auxilie líderes de Compliance e Recursos Humanos a identificarem e resolver problemas de má conduta é uma excelente estratégia.
Uma solução como a da SafeSpace permite o gerenciamento de relatos online, com segurança e anonimato para quem relata. Além de gerar insights estratégicos com base nos padrões de comportamento, cultura e ética da empresa para direcionar as iniciativas de prevenção e resolução dos relatos.
Quer aprender mais sobre como sair da teoria para a prática? Leia o artigo: Por que a SafeSpace gera confiança no fluxo de denúncias?'.