O verdadeiro custo do assédio
Artigo publicado em 17/12/2019
O problema de assédio sexual no ambiente de trabalho está sendo cada vez mais discutido e hoje a maioria de nós entende que a persistência de relações abusivas no trabalho pode causar danos irreversíveis à saúde física, emocional e psicológica de uma pessoa. Com o surgimento de movimentos como o #metoo, o tema também ganhou relevância na mídia internacional e hoje ocupa um espaço importante quando o assunto é o futuro do trabalho.
Entretanto, se quisermos realmente resolver esse problema precisamos abordá-lo de uma forma que seja atraente para as empresas também, afinal de contas elas detêm o controle sobre o que acontece dentro do ambiente de trabalho e tem influência sob as relações de poder que antecedem qualquer tipo de abuso.
Então vamos lá: Por que que um CEO de uma grande empresa que só pensa em maximizar lucro deve dar mais atenção para casos de assédio?
Um estudo acadêmico realizado nos Estados Unidos se propôs a responder essa pergunta. A pesquisa, intitulada “Me Too: Does Workplace Sexual Harassment Hurt Firm Value?”, usa mais de 1 milhão de reviews feitos por funcionários(as) e ex-funcionários(as) de mais de 1000 empresas americanas no Glassdoor e no Indeed como base para mostrar como o assédio sexual no ambiente de trabalho afeta os resultados financeiros das empresas.
O estudo classificou as empresas de acordo com uma taxa de assédio sexual, definida pelos pesquisadores com base na frequência e gravidade de casos publicados. A partir de uma análise feita usando essa segmentação e alguns indicadores de desempenho, os resultados do estudo apontaram que:
As 101 empresas com a taxa de assédio mais altas tiveram em média um desempenho 19,9% inferior ao do mercado de ações dos EUA. Em 2017, essas empresas tinham uma capitalização de mercado combinada de aproximadamente US $ 1,1 trilhão. Isso se traduz em uma desvalorização de US $ 212,2 bilhões por ano (US $ 1,1 trilhão multiplicado por 19,9%), ou uma desvalorização média anual de US $ 2,1 bilhões por empresa.
Existe uma relação entre a taxa de assédio e o lucro das empresas. Para essas empresas com as taxas mais altas, o retorno sobre os ativos (ROA) e o retorno sobre o patrimônio (ROE) caíram cerca de 4,2% e 10, 9%, respectivamente nos dois anos seguintes às avaliações.
Nesse mesmo período de dois anos, os custos de mão-de-obra aumentaram em média 7% para essas mesmas empresas.
Isso nos mostra que os custos indiretos do assédio sexual no ambiente de trabalho são ainda mais altos do que os custos diretos, porque estão diretamente ligados à produtividade dos(as) funcionários(as) — que representam o maior ativo das empresas.
Precisamos ampliar a discussão sobre assédio no ambiente de trabalho, já que essa relação entre produtividade da força de trabalho e cultura organizacional ainda não é muito intuitiva para quem está em posições de liderança nas empresas. Muitas dessas pessoas ainda interpretam casos de assédio no trabalho como questões isoladas, pouco frequentes e que não têm impacto direto no desempenho da empresa. Além de ser moralmente repreensível e um reflexo de relações de poder distorcidas, a persistência desse problema é extremamente prejudicial para o valor de qualquer empresa.