O impacto do movimento #MeToo na construção de cultura das empresas

Frigideira em cima de uma lagosta sobre fundo amarelo e branco

Estamos vendo uma profunda mudança na forma com que as pessoas enxergam a questão de má conduta (especialmente assédio sexual) no ambiente de trabalho.

O movimento #MeToo é um marco importante da nossa era

O movimento #MeToo mudou a percepção das pessoas sobre que tipos de comportamento são aceitáveis no ambiente de trabalho e à respeito da importância de manter uma cultura organizacional saudável. A condenação de Harvey Weinstein é um marco importante dessa era, representando uma mudança de paradigma necessária - não só em termos de justiça criminal mas em relação a maioria dos casos de assédio e abuso sexual que nunca vão ser denunciados formalmente.

Estamos vendo uma profunda mudança na forma com que as pessoas enxergam a questão de má conduta (especialmente assédio sexual) no ambiente de trabalho. A consciência e a vigilância das pessoas em torno do que é aceitável está aumentando significantemente. As pessoas estão cada vez mais dispostas a se manifestar quando enfrentam (ou testemunham) problemas de comportamento. Isso, combinado com o fato de que o número de meios digitais pelos quais é possível fazer isso está crescendo rápido, significa que as empresas e pessoas envolvidas em casos desse tipo vão encarar dificuldades para escaparem dos danos à reputação.

Além disso, a eficácia do uso de acordos de confidencialidade para silenciar vítimas não é mais a mesma e empresas serão observadas e pressionadas em relação ao uso dessa ferramenta legal. As empresas vão precisar melhorar os processos para lidar com casos internamente se quiserem evitar danos à reputação. 



Casos de má conduta no ambiente de trabalho podem ser subjetivos e complexos e por isso empresas precisam começar a reconhecer relações de poder e dar ouvidos aos seus funcionários constantemente para evitar que situações de abuso cheguem nesse nível devastador. 

O caso Weinstein nos coloca em uma nova era de empoderamento dos funcionários e de abertura de espaço na mídia para falar de questões comportamentais "tabu" como assédio e discriminação no local de trabalho. Isso significa que as empresas que querem construir culturas de trabalho saudáveis e inclusivas daqui para frente vão precisar rever processos de Compliance e de Recursos Humanos para se adaptar à essa nova realidade.

Para colocar em perspectiva a relevância do movimento MeToo, maior movimento de conscientização sobre abuso e assédio sexual da atualidade, vale contextualizar o caso de Harvey Weinstein. Weinstein era um renomado produtor cinematográfico norte-americano, carreira que lhe rendeu diversos prêmios e sucessos de bilheteria. Em outubro de 2017, despontaram as primeiras denúncias contra o produtor. As alegações vinham de mulheres que declaravam terem sido abusadas por Weinstein, que as forçava a massageá-lo e vê-lo nu, sendo também foi acusado de solicitar favores sexuais em troca de alavancagem profissional para as mulheres. Às primeiras denúncias somaram-se diversas outras, de nomes muito grandes da indústria do cinema, como Gwyneth Paltrow e Angelina Jolie. Como resultado, Weinstein foi condenado a mais de 20 anos de prisão em janeiro do ano passado por um único julgamento, outros ainda o esperam. 

Mas como Weinstein se relaciona ao #MeToo? Bom, o termo #MeToo foi cunhado em 2006 por uma ativista e sobrevivente norte-americana, Tarana Burke. Contudo, só ganhou popularidade e se tornou amplamente difundido em outubro de 2017, após o escândalo de Harvey Weinstein, quando a atriz Alyssa Milano tweetou uma mensagem que clamava a participação das meninas que já haviam sofrido algum tipo de má conduta sexual em espaços comuns: 

Captura de tela de um tweet sobre o movimento MeToo

Figura  1 – tweet de Alyssa Milano que iniciou o movimento #MeToo

Em tradução livre, o tweet diz o seguinte:

Se você já foi assediada ou abusada sexualmente responda esse tweet com ‘eu também’.

Acompanhado de uma foto, em cujo texto se lê:

Eu também.

À sugestão de uma amiga: “se todas as mulheres que já sofreram abuso ou assédio sexual escrevessem ‘eu também’ em seus status, talvez daríamos às pessoas uma noção da magnitude do problema.”

A atriz responde ao próprio tweet: “eu também”. Diversas mulheres seguiram o fio e fizeram o mesmo comentário, sendo que algumas até compartilharam suas histórias. O movimento ganhou ainda mais notoriedade quando mais celebridades se juntaram, como Lady Gaga e Laura Dreyfuss. O próprio Twitter se pronunciou institucionalmente, destacando o movimento e exaltando o empoderamento e o apoio às vozes das mulheres.

O movimento #MeToo se tornou uma sensação mundial, extravasando as fronteiras dos Estados Unidos e se espalhando pelo mundo, chamando a atenção e levantando a importância da discussão sobre má conduta sexual em diversos ambientes. O movimento deu propulsão para a criação de outro projeto: Time’s Up (Acabou o tempo, em tradução livre), que foca principalmente em ampliar a voz de mulheres que sofrem abuso e são vítimas de má conduta sexual no ambiente de trabalho. A iniciativa também conta com arrecadação de fundos para fornecer assistência a mulheres que sofreram assédio e tem intenção de denunciar.

O #MeToo demonstrou a seriedade da questão de má conduta em relação às mulheres, atribuindo muito mais credibilidade aos discursos e denúncias realizadas por elas. As empresas foram obrigadas a repensar suas culturas e as estruturas que possibilitavam a impunidade dos agressores. O movimento fomentou também discussões sobre diferenças salariais entre homens e mulheres e as dificuldades dessas últimas em chegarem a cargos de liderança (o que popularmente chamamos de “teto de vidro” ou glass ceiling). A mensagem que devemos carregar do #MeToo é que casos de assédio às mulheres são majoritariamente sintomas de problemas maiores, como acesso desigual ao poder e culturas que permitem impunidade. 

Hoje em dia, existem muitas campanhas de melhoria às condições empresariais, mas ainda existe um longo caminho pela frente. Um exemplo é o próprio caso de Harvey Weinstein: apesar de o produtor já ter sido condenado, sua empresa The Weinstein Co. se utiliza de meios legais para abafar os processos de abuso sexual que responde, propondo uma compensação financeira de acordo com a severidade do caso (em outras palavras, as vítimas terão que provar o quão “sério” foram os abusos sofridos) e fazendo com que as vítimas assinem um documento que desfaça qualquer relação que tivessem com Weinstein, caso contrário perderiam 75% de sua indenização. 

O caminho a seguir ainda é longo, mas a discussão está aberta. Toma cerca de uma década ou mais para que padrões de comportamento social sejam mudados. O #MeToo ainda há de fazer seu quinto aniversário. O debate sobre poder e responsabilidade dentro das empresas deve ser cada vez mais incentivado e levado a sério. Quem sabe daqui vinte anos vemos ambientes de igualitários e sem disparidade de acesso ao poder... 


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