Comunicação Inclusiva no Recrutamento: a forma de falar faz a diferença
Se colocados em comparação com outros animais, seres humanos se destacam pela habilidade de se comunicar. Essa é a característica que permite o convívio em sociedade há milhares de anos, fazendo com que a gente adapte a linguagem de acordo com as demandas da evolução social.
Em outras palavras, é importante olhar para a comunicação humana sob a ótica de um fenômeno contínuo, em constante transformação, sempre a serviço das pessoas. A comunicação inclusiva surge, então, para suprir a necessidade de não discriminar a diversidade etnicorracial, cultural, de condição e de gênero nas falas que reproduzimos diariamente.
O fato é: causamos impacto ao nosso redor com a forma como comunicamos ideias. Nossa voz é instrumento de expressão, construção de identidade e, como consequência, de inclusão social. Por isso, é essencial garantir e promover acessibilidade por meio dos recursos de linguagem.
Partindo dessa ideia, a SafeSpace preparou o Guia de Comunicação Inclusiva voltado para as áreas de RH e Compliance de empresas. O conteúdo traz, de forma leve e fácil, boas práticas para adaptar a comunicação no dia a dia corporativo (e até fora do trabalho).
Comunicação é posicionamento
Uma das críticas mais frequentes em relação às estratégias de Diversidade e Inclusão dentro das empresas é que parte delas é feita apenas com fins de marketing. Se levarmos em consideração pessoas consumidoras e profissionais cada vez mais atentas e exigentes, essa prática que chamamos de “diversity washing” tem impacto negativo no longo prazo, uma vez que não gera transformações culturais reais.
Dessa forma, cada vez mais o mercado exige um posicionamento claro das organizações frente a aspectos sociais. A imagem de uma marca é consequência da forma como ela se relaciona com a sua comunidade, atribuindo à comunicação um papel muito importante no compromisso com a ética corporativa.
Uma pesquisa realizada pela RepTrak, veiculada pela Exame, reforça que a percepção do mercado sobre uma marca é ponto importante na disputa por um lugar de destaque. Ter um propósito claro em relação a aspectos ambientais, sociais e de governança causam um impacto maior do que os próprios produtos ou serviços na construção da reputação de uma empresa.
Não basta vestir a camisa para aparecer bem na foto, se não cuidarmos da inclusão dentro do ambiente de trabalho. As pessoas colaboradoras podem ser as principais defensoras da marca, afinal, são elas que materializam os valores de uma empresa. Lideranças precisam revisitar a noção de reputação com o olhar de marca empregadora, reforçando a importância de uma cultura interna segura, em que todas as pessoas se sintam acolhidas e pertencentes.
A mudança deve chegar nos processos seletivos
Não é novidade a urgência de criar processos seletivos afirmativos para incentivar, cada vez mais, a contratação de grupos diversos dentro das organizações. Mas é importante frisar o papel da área de Recursos Humanos na implementação de uma comunicação inclusiva na atração e gestão de novos talentos.
Com o objetivo de entender mais a fundo essa demanda dentro das empresas, a consultoria CKZ Diversidade e a Mappit, empresa especializada em início de carreira e contratação inclusiva, conduziram uma pesquisa com 160 pessoas.
Os dados foram divulgados pelo Valor Econômico: abordando o nível de diversidade e inclusão na hora dos processos seletivos, 47,77% das pessoas entrevistadas disseram que os anúncios de vagas não levam em consideração diferentes identidades. 15,43% afirmaram, ainda, já terem visto questões de gênero sendo abordadas de maneira pejorativa.
Pensando em mudanças que podem ser aplicadas no recrutamento de empresas, a SafeSpace separou algumas recomendações para o seu processo seletivo:
Evite terminologias que designam gênero
O uso de linguagem neutra pode determinar se alguém vai ou não entrar em um processo seletivo. Para evitar uma comunicação essencialmente binária, isto é, com fortes definições de feminino e masculino, existem algumas alternativas simples.
Uma palavra bem familiar em nosso vocabulário ajuda bastante: pessoas. Aqui vão alguns exemplos: pessoas colaboradoras, pessoas LGBTQIA+, pessoas candidatas.
A língua portuguesa tem, ainda, alguns termos coletivos que podem ser aproveitados para garantir neutralidade na fala. Ao falar em líderes, prefira se referir à liderança. Pense na gestão, ao invés de ‘nos gestores’. Seus colaboradores são um time, ou equipe.
Prefira usar termos em português
É comum vermos termos técnicos serem usados em inglês no mundo corporativo. Palavras como “briefing”, “mindset”, “budget” aparecem com frequência em descrições de vagas e podem ser o motivo para uma pessoa desistir da candidatura, mesmo estando dentro das outras qualificações para a função.
Se a fluência em outro idioma não for requisito básico para o escopo da vaga, procure usar termos em português. O uso do inglês, por exemplo, acaba sendo uma prática excludente, considerando a falta de acesso da maior parte da população brasileira hoje.
Reconheça e desconstrua vieses inconscientes
Nós estamos acostumados com a construção de vieses inconscientes em relação à diversas características, sejam elas de gênero, raça, orientação sexual, religião, entre outras que colocamos como “diversas”.
É extremamente importante entender, reconhecer e desconstruir essas crenças enraizadas para que elas não interfiram na condução de processos seletivos e, no longo prazo, reforcem tais ideias dentro da sociedade. É quase como quebrar um ciclo antigo, e por isso exige esforço de todos níveis hierárquicos da empresa.
Atenção, também, a algumas expressões que ouvimos no dia a dia que reproduzem preconceitos estruturais e acabam passando despercebidas. São alguns exemplos:
“Tá de TPM?”
“Inveja branca”
“Feito nas coxas”
“Aleijado”
“Retardado/retardada”
Atente-se ao comunicar vagas afirmativas
Processos seletivos afirmativos têm como objetivo reparar injustiças históricas e endereçar alguns dos principais problemas da nossa sociedade. Assim, incentivam e dão espaço para que estas pessoas ingressem no mercado de trabalho e, claro, tenham acesso às mesmas oportunidades.
Em vagas afirmativas raciais, por exemplo, prefira usar negro ou negra para designar um grupo de pessoas com a pele cor parda e/ou preta. Já, preto ou preta, para pessoas negras com a pele retinta, ou seja, com os tons mais escuros.
Por fim, reforce o compromisso da empresa com D&I. Se a organização já direciona esforços para tornar o local de trabalho mais seguro e inclusivo, vale incluir nas descrições de vagas também.
A comunicação é um divisor de águas para que a inclusão seja realmente efetiva. Afinal, é o que costumamos falar aqui na SafeSpace: é fácil ter diversidade dentro da sua equipe, mas é apenas o primeiro passo de um longo caminho. É preciso promover mudanças internas, envolver as lideranças no processo e estar disposto a se reeducar para que todas as pessoas se sintam seguras, respeitadas e pertencentes à organização em que trabalham.