Perguntas, respostas e provocações sobre Inclusão com Tânia Chaves, especialista em D&I
Artigo publicado em 28/01/2022
No SafeSpace Convida deste mês, o papo foi com Tânia Chaves. Comunicadora de formação, palestrante e especialista em Diversidade e Inclusão, atualmente nossa convidada está à frente da área no grupo Ânima Educação, que tem atuação no Brasil inteiro.
Ao longo da conversa, Tânia nos trouxe reflexões sobre as habilidades essenciais para pessoas em cargos de D&I e o papel da área de comunicação na efetivação de estratégias dentro das empresas. Boa leitura!
Para começar, vamos falar um pouco da sua trajetória até aqui. Quem é a Tânia?
Eu sou filha da Glória, dona de casa, e do Hélio, pedreiro. Tenho 8 irmãos e sou uma das mais novas de uma família grande, unida e festiva. Somos de origem periférica e, com muito esforço, somente eu e minha irmã concluímos o ensino superior. Também sou mãe do Ismael, um menino de 14 anos, e esposa do Robson, escultor.
Minha formação é em Comunicação, com habilitação em Relações Públicas. Comecei a trabalhar muito nova, mas meu primeiro emprego formal foi aos 16 anos, em uma agência de publicidade. Foi lá que eu me apaixonei pela área e, então, minha trajetória como comunicadora passou por cargos como Analista de Marketing, Coordenadora, Redatora e Revisora, em diferentes segmentos de empresas.
Em 2020, depois do episódio do George Floyd, a Ânima, empresa em que eu atuo hoje, começou a se incomodar. Trata-se de uma empresa de ensino superior e, de maneira muito orgânica, já carregava em seu DNA os pilares da diversidade. Mas, a partir deste momento, eles decidiram efetivar uma política interna de Diversidade e Inclusão e me convidaram para fazer parte do processo seletivo e assumir a área.
É desafiador tomar frente das estratégias de D&I em uma organização que atua no Brasil inteiro, um país tão grande. Em paralelo a isso, sou palestrante e consultora de D&I para outras empresas.
Como profissional que atua a nível nacional na área, quais habilidades/características você considera importantes para conduzir essa posição?
Acredito que a pessoa precisa ter algumas características para conduzir uma área de Diversidade e Inclusão: boa comunicação, sede de conhecimento, empatia e uma pitada de inconformismo.
Comunicação é importante porque é uma área que fala com a empresa inteira, desde a base até as reuniões de conselho. A empatia, por sua vez, tem que ser colocada de forma inteligente: não é possível se colocar no lugar do outro, mas é preciso ter vontade de entender qual é este lugar.
Existe uma ideia dentro das empresas, hoje, que a área de D&I não pode “militar”. Aproveitando o uso do termo, que muitas vezes assume um tom pejorativo, não consigo entender como tomar frente dessas estratégias sem carregar essa “militância”. Uma dose de inconformismo é essencial, quando equilibrada com a inteligência emocional.
É importante saber lidar com a dor, não só dos outros, mas a sua também. Afinal, as empresas normalmente buscam pessoas de grupos sub representados para assumir posições nas áreas de D&I. Não ser passional diante de algumas situações evita sofrimento.
Embora a diversidade seja um tema cada vez mais presente no mundo corporativo, ainda faltam estratégias efetivas para a inclusão. Pensando na área de processos seletivos e gestão de talentos, em que momento você diria que o mercado brasileiro está nesse sentido?
As empresas se movimentam porque a diversidade ainda está muito atrelada aos números importantes que aparecem na apresentação de PowerPoint. Quando contratamos 10 mulheres, por exemplo, que ambiente estamos criando para que essas mulheres sejam inseridas?
Pensando na área de talentos, estamos engatinhando ainda. É comum vermos vagas afirmativas para posições de estágio ou júnior, mas eu nunca vi uma vaga afirmativa para o Conselho. Quando olhamos para cima nas hierarquias, mais brancas, masculinas e cis-héteras se tornam as posições. Uma inclusão efetiva exige metas internas e estratégias para abrir espaço em posições de gestão.
“Um processo seletivo aberto apenas para cargos de base retarda o avanço das políticas de diversidade, uma vez que a mudança efetiva só ocorre quando vai até o topo”
Como você entende o papel da comunicação para um mercado de trabalho mais inclusivo?
Uma grande amiga, Dirlene Silva, tem uma fala que eu gosto bastante: “um tabu só se quebra quando alguém fala sobre ele.”
Eu venho de uma geração em que Diversidade e Inclusão não eram pautas. É um grande passo trazer o tema para as redes sociais, colocá-lo no topo dos assuntos mais falados. A comunicação é o motivo de as empresas quererem criar frentes estratégicas na área, e por isso o papel dela é tão alavancador.
Dentro da Ânima, a área de D&I tem 4 pilares: Recrutamento, Seleção e Progressão; Letramento e Sensibilização; Metas e Indicadores; Comunicação. Sem essa quarta parte, nosso trabalho não chega às pessoas colaboradoras e stakeholders. É muito importante que a comunicação da empresa caminhe lado a lado com a atuação da nossa área.
É válida a análise do mercado da comunicação como um todo, que ainda é muito desigual no país. Isso tem um reflexo muito grande nos veículos midiáticos, seja na Publicidade ou no Jornalismo. Ao longo dos anos, nunca tive pessoas negras trabalhando do meu lado, muito menos líderes. Essa falta de representatividade tem um impacto enorme nas mensagens que transmitimos e nos conteúdos que consumimos.
Se pudesse indicar alguns materiais para as atuais lideranças que buscam se aprofundar em D&I com um olhar estratégico, quais seriam? Pode ser um livro, um filme, um TEDx... Fica a seu critério!
O debate ainda está no comecinho, então acredito que as lideranças precisam aprender o básico. Eu indico os livros “Na Minha Pele”, do Lázaro Ramos, e o “Pequeno Manual Antirracista”, da Djamila Ribeiro.
O TEDx da Djamila é um conteúdo que indico também. Ela fala muito sobre o silenciamento e apagamento histórico de grupos. Ainda que indiretamente, toca no ponto que levantamos da ausência de minorias em cargos de liderança.